O déjà-vu belga na Euro 2024

O ano é 2024, a competição é a Eurocopa, o local é a Alemanha, e o treinador é Domenico Tedesco. Contudo, a impressão deixada pela Bélgica após a surpreendente queda diante da Eslováquia é que os Diabos Vermelhos ainda estão em 2022, na Copa do Mundo do Catar, sendo comandados por Roberto Martínez.

Pois é, se você não se recorda, embora situada em uma chave pra lá de acessível ao lado de Croácia, Marrocos e Canadá, a Bélgica caiu na fase de grupos da última Copa do Mundo ao somar míseros quatro pontos em três jogos disputados, contabilizando uma vitória, uma derrota e um empate em solo catari. Consequentemente, o longo ciclo de seis anos de Roberto Martínez foi encerrado de maneira melancólica à frente da seleção belga, ao passo que o de Domenico Tedesco começou dois meses depois.

Embora inexperiente e sem ter realizado nenhum longo trabalho no decorrer da carreira, Domenico Tedesco foi o técnico escolhido para liderar o novo processo de reconstrução da Bélgica, que incluiu as saídas de importantes nomes como Dries Mertens, Michy Batshuayi, Christian Benteke, Thorgan Hazard, Dennis Praet e Leander Dendoncker, e a chegada de uma nova e promissora geração formada por Zeno Debast, Amadou Onana, Arthur Vermeeren, Aster Vranckx, Johan Bakayoko, Jérémy Doku e Charles De Ketelaere.

Em todo o caso, a empolgação dos torcida belga aumentou pra valer depois do ótimo início de Domenico Tedesco, que desembarcou invicto na Alemanha para a disputa da Eurocopa contabilizando 10 vitórias e quatro empates no comando da Bélgica, classificada como líder do grupo F das Eliminatórias com 20 pontos.

Diante deste cenário, nem o mais pessimista dos torcedores da Bélgica imaginava que a Eurocopa seria uma espécie de déjà-vu da Copa de 2022 aos Diabos Vermelhos, a julgar pela derrota por 1 a 0 sofrida frente os eslovacos na estreia de ambos em Frankfurt. A propósito, neste que veio a ser primeiro revés dos belgas para a seleção da Eslováquia depois de quatro enfrentamentos ao longo da história (2E-1V-1D).

Aliás, as chances desperdiçadas por Romelu Lukaku, aliadas a sua falta de sorte, também compõe o “déjà-vu belga”, lembrando que o maior artilheiro da Bélgica em todos os tempos, que passou em branco no Mundial anterior, teve três oportunidades para marcar, e nas outras duas vezes que até chegou a balançar as redes acabou tendo os gols anulados. O primeiro deles, em razão de um impedimento, à medida que o segundo tento foi invalidado devido a uma mão na bola de Lois Openda, assinalado através de uma nova ferramenta da UEFA bastante similar a um exame de cardiograma, usada para detectar esse tipo de infração. Portanto, nem a tecnologia estava a favor de Big Rom.

Evidentemente, o talento de Romelu Lukaku é indiscutível. Não à toa, ele é o terceiro maior goleador por seleções em atividade com 85 gols em 115 jogos, estando somente atrás de Cristiano Ronaldo (130) e Lionel Messi (108). No entanto, como qualquer atleta da posição, o atacante da Roma está sujeito a falhas, haja vista a Copa do Mundo de 2022.

Ao analisarmos a escalação da Bélgica fica evidente que Domenico Tedesco armou a seleção em torno de Romelu Lukaku, utilizando os pontas Jérémy Doku, pela direita, e Leandro Trossard, pela esquerda, além de Kevin De Bruyne posicionado um pouco mais atrás jogando como meia centralizado, todos com a tarefa de municiar o camisa 10. Por isso, quando ele não acerta a pontaria tudo acaba mal aos Diabos Vermelhos.

Acontece, que essa Eurocopa tem uma relevância maior para Romelu Lukaku. A começar porque ao que tudo indica será a última da sua carreira, tendo em vista que na próxima edição ele estará com 35 anos de idade. Além disso, Lukaku precisa provar o seu valor para que algum clube europeu esteja disposto a comprá-lo por cerca de 45 milhões de euros junto ao Chelsea, após passagens via empréstimo por Inter de Milão e Roma nas últimas duas temporadas.

De qualquer maneira, apesar do resultado negativo é inegável o fato de que Domenico Tedesco tentou todas as possibilidades possíveis para evitar a sua primeira derrota no cargo, tanto é, que a Bélgica encerrou a partida com Youri Tielemans, Louis Openda, Dodi Lukebakio, Kevin De Bruyne e Romelu Lukaku em campo, depois de ter alterado os lados de Jérémy Doku e Leandro Trossard no retorno do intervalo.

Todavia, o gol de Ivan Schranz – marcado aos 7 minutos da etapa inicial -, o VAR que pela primeira vez anulou dois gols de um mesmo jogador em uma única partida de um grande torneio de seleções, a falta de pontaria de Romelu Lukaku, e as ótimas exibições tanto do goleiro Martin Dúbravka quanto do meio-campista Stanislav Lobotka, culminaram com o fim da extensa invencibilidade de 14 jogos por parte dos belgas.

Deste modo, a pressão que Domenico Tedesco jamais viveu desde que assumiu o selecionado belga em fevereiro do ano passado, surgiu justamente depois da rodada inicial da Euro 2024. Inclusive, vale ressaltar que o atual vínculo contratual do ex-treinador do RB Leipzig é válido somente até o final do torneio continental, o que significa que a sua continuidade depende única e exclusivamente de uma boa campanha da Bélgica.

Ainda assim, ao contrário do que ocorreu há um ano e meio no Catar, a tendência é que a Bélgica avance às oitavas-de-final da Eurocopa. Para isso, serão necessários no mínimo um empate e uma vitória nos próximos compromissos ante Romênia e Ucrânia, o que garantiria aos pupilos de Domenico Tedesco a classificação como um dos quatro melhores terceiros colocados da competição, ou então como vice-líder do grupo E.

Obviamente, no caso de duas vitórias os Diabos Vermelhos ainda poderão se qualificar como líderes, porém tudo dependerá dos demais resultados. Em outras palavras, uma condição que já retrata o quão decepcionante é a campanha Bélgica na chave mais fácil da Euro 2024.

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