A abrupta mudança de Portugal ao ir de Fernando Santos a Roberto Martínez

Ser o antídoto ao pragmatismo e à tática previsível do antecessor Fernando Santos, eis a missão de Roberto Martínez ao desembarcar em solo português para assumir o comando técnico da Seleção das Quinas no início do ano passado.

Pois é, e depois do triunfo por 2 a 1, de virada, sobre a República Tcheca, é possível afirmar que Roberto Martínez vem atendendo totalmente as expectativas, vide a composição tática dos portugueses na partida de estreia na Euro 2024. Para se ter uma ideia, Portugal entrou em campo armado no 3-4-3, com Rúben Dias, Pepe, além do lateral-esquerdo Nuno Mendes formando o trio de zaga, Diogo Dalot, Vitinha, Bruno Fernandes e João Cancelo compondo o meio, enquanto Bernardo Silva, Cristiano Ronaldo e Rafael Leão completavam o ataque.

Desta maneira, a intenção de Roberto Martínez era explorar o corredor esquerdo por intermédio dos avanços de Nuno Mendes sob a parceria de Rafael Leão, à medida que o ala invertido, João Cancelo, passou a atuar por dentro a fim de ajudar na construção de jogo juntamente com Vitinha e Bruno Fernandes, é claro, durante a fase ofensiva, quando os portugueses estavam com a posse da bola.

Consequentemente, Portugal controlou completamente as ações da partida registrando o total de 73% de posse de bola, além de ter trocado nada menos que 704 passes, que inclusive se tornou o maior número dos portugueses em Eurocopas até hoje. Entretanto, o gol de Lukas Provod, aos 17 minutos da etapa final, não estava no roteiro de Roberto Martínez, que ainda assim demorou uma eternidade para mexer na equipe.

À vista disso, a estreia portuguesa na Eurocopa acabou ganhando um tom dramático, já que o gol da virada veio somente aos 47 minutos do segundo tempo. Aliás, um tento marcado por Francisco Conceição, que havia entrado em campo 111 segundos antes de balançar as redes graças ao grande lance individual finalizado com uma belíssima assistência de Pedro Neto, o outro suplente que veio do banco de reservas com o filho do ex-técnico do Porto, Sérgio Conceição.

Seja como for, a ideia primordial de Roberto Martínez através de toda essa engenharia tática era fazer Portugal criar uma superioridade númerica na linha de construção, tendo sempre uma peça a mais para contribuir na armação do jogo, no caso, João Cancelo. Por esta razão, ele abriu mão da utilização de um primeiro volante de origem ao utilizar os meias Vitinha e Bruno Fernandes centralizados no meio-campo, o que deixou a defesa mais exposta.

Vale ressaltar que os portugueses estrearam na Eurocopa sem Roberto Martínez conhecer sua melhor formação de onze titulares. Não à toa, ele realizou o montante de 13 trocas nos três últimos amistosos antes do início do torneio continental, jogando no 4-3-3 diante de Finlândia e Croácia, e no 3-4-1-2 contra a Irlanda. Ou seja, exemplos que evidenciam as dúvidas do técnico espanhol às vésperas da competição.

Por outro lado, é inegável que Roberto Martínez tem ingredientes de sobra para cozinhar um saboroso prato na Euro 2024, acima de tudo porque apenas Raphael Guerreiro e Otávio desfalcaram Portugal devido a lesões. Logo, a profundidade do elenco dá ao treinador de 50 anos de idade um leque de opções que a grande maioria dos oponentes não tem.

Obviamente, é raro qualquer seleção repetir tanto a escalação quanto a formação do jogo de estreia no restante de um torneio de tiro curto, a julgar pela Argentina, campeã da Copa do Mundo de 2022, que começou o Mundial perdendo da Arábia Saudita no 4-4-2, e derrotou a França na decisão atuando no 4-3-3, com Enzo Fernández, Alexis Mac Allister e Julian Álvarez entre os titulares – nos lugares de Leandro Paredes, Papu Gómez e Lautaro Martínez.

Portanto, a tendência é que Roberto Martínez mude a escalação de Portugal na próxima partida contra a Turquia, especialmente em razão da vulnerabilidade defensiva do time que sofreu um gol dentre as pouquíssimas descidas da República Tcheca ao ataque. Decerto, o deslocamento de João Cancelo para ocupar a vaga de Nuno Mendes na lateral-esquerda, somada as entradas de Nelson Semedo no lugar de Diogo Dalot, e a de João Palhinha no meio-campo, tornariam a defesa mais consistente.

Ademais, a rica trajetória, bem como a experiência de Pepe, no auge dos seus 41 anos, poderão dar espaço ao vigor e a jovialidade de Gonçalo Inácio, certamente, um dos zagueiros mais promissores do futebol mundial, que ainda faria a seleção lusitana ganhar maior qualidade na saída de bola. Por sinal, essa é uma das trocas que devem acontecer por conta de aspectos físicos, afinal, é improvável que o jogador do Porto suporte a maratona de jogos até o término da Eurocopa.

Deste modo, ainda que a Turquia também adote a postura de jogar com os blocos baixos e explorando os contra-ataques, tudo nos leva a crer que Portugal terá ao menos um primeiro volante entre os titulares, seja com uma linha de três, seja com uma linha de quatro homens na defesa, já que por questão de minutos a estreia dos pupilos de Roberto Martínez na Euro 2024 não terminou com um empate no placar, apesar do nível técnico inferior da República Tcheca.

Em todo o caso, a realidade é que com Roberto Martínez as preocupações dos portugueses passaram a ser referentes a parte defensiva, diferentemente do que ocorreu ao longo dos últimos oito anos em que o ataque sempre foi um problemaço com Fernando Santos.

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