O último prego foi martelado no caixão do Bordeaux

Há dois anos, os torcedores girondinos sofriam a duríssima dor do rebaixamento em função da fatídica campanha do lanterna Bordeaux, na temporada 2021-22 da Ligue 1, que inclusive determinou o descenso do clube seis vezes campeão francês, algo que não ocorria desde 1992.

No entanto, o que nem o mais pessimista torcedor do Bordeaux imaginava era que duas temporadas mais tarde, o clube pelo qual passaram figuras como Zinedine Zidane, Bixente Lizarazu, Christophe Dugarry, Jean Tigana, Jules Koundé e Aurélien Tchouaméni, encerraria as suas atividades depois de 104 anos de história, em razão da devastadora crise financeira que o assolou.

Décimo terceiro colocado da edição passada da Ligue 2, o Bordeaux perdeu o status de clube profissional no início de julho, quando informou a DNCG (Direção Nacional do Controle de Gestão, entidade responsável por supervisionar as finanças das agremiações do futebol francês) que não conseguiria fornecer garantias econômicas para a disputa da temporada 2024-25, o que já era esperado para o time cuja folha salarial ultrapassou a casa dos 35 milhões de euros no último ano.

Consequentemente, o Troyes, que havia encerrado a Ligue 2 na 17ª posição da tabela na temporada seguinte à queda na Ligue 1, acabou tendo a segunda despromoção consecutiva anulada, a julgar que o Bordeaux herdou a sua vaga como rebaixado à Championnat National — como é chamado o terceiro escalão da França, onde equipes profissionais e não profissionais se misturam. 

Em contrapartida, o Bordeaux sofreu outro golpe por não ter convencido a DNCG de que teria condições para operar na Championnat National, o que o fez descer à Nationale 2 — o equivalente a 4ª divisão —, de acordo com a FFF (Federação Francesa de Futebol), lembrando que os girondinos podem recorrer a esta decisão, sob o risco de se exporem a uma sanção ainda mais pesada.

Logo, fica claro que a situação vivida pelo Bordeaux é realmente caótica, tanto é, que a única salvação seria o pagamento da dívida de 40 milhões de euros por parte do clube gerido por Gerárd Lopez desde 2021. A propósito, vale ressaltar que o Fenway Sports Group (FSG), companhia que administra o Liverpool, entrou em negociações para comprá-lo, a fim de evitar a sua ida à quarta divisão. Entretanto, as conversas não evoluíram.

Contudo, o Bordeaux não é a primeira “vítima” de Gerárd Lopez, tendo em vista que ele já ostenta a fama de falir vários clubes e instituições, como foram os casos da Lotus, na Fórmula 1, do Royal Excel Mouscron, no futebol belga, além do Boavista, de Portugal, cujo destino é semelhante. Por sinal, o Lille também acumulou dívidas astronômicas ao longo dos anos em que teve o empresário hispano-luxemburguês como proprietário, escapando do colapso somente porque Olivier Létang o adquiriu em dezembro de 2020.

Portanto, por mais que a crise vivida pelo Bordeaux seja reflexo do conjunto de erros administrativos cometidos na última década, em especial pelas constantes mudanças de donos, é inegável que a incompetência de Gerárd Lopez foi crucial para levá-lo à beira do abismo, primeiramente, através da demissão do técnico suíço Vladimir Petkovic depois de míseros seis meses no cargo, seguida da pífia campanha do rebaixamento na Ligue 1 2021-22, composta pelo montante de 19 derrotas e 91 gols sofridos, em 38 rodadas.

Posteriormente, tanto as dispensas dos experientes Benoît Costil e Laurent Koscielny, quanto a rescisão contratual junto ao patrocinador máster — uma empresa de apostas online —, só agravaram a crise do clube que passou a ser amador pela primeira vez em quase 90 anos, ou desde 1937, ao entrar em recuperação judicial.

Todavia, ainda que a realidade do Bordeaux seja pra lá de crítica, o clube francês ainda atraí o interesse de diversos investidores não apenas devido a sua riquíssima história, mas também por ter uma das maiores torcidas da França — que atraiu uma média de público de 21.636 como mandante na última temporada —, além de estar situado em uma importante cidade portuária, conhecida por ser a capital mundial do vinho.

Para se ter uma ideia, em 2010, um ano após ter erguido o caneco da Ligue 1 sob o comando de Laurent Blanc, o Bordeaux caiu diante do conterrâneo Lyon nas quartas-de-final da Champions League. Na ocasião, os girondinos superaram os poderosos Bayern de Munique e Juventus na fase de grupos do torneio continental, se classificando como líderes da chave somando cinco vitórias e um empate, nos seis jogos disputados.

Em todo o caso, enquanto um novo comprador não desembarca em Bordeaux, os Maritimes continuam enfrentando um enorme desmanche em decorrência da liberação de todos os seus jogadores, dentre eles, os novatos Mathys Angely, alvo do Liverpool, e o volante Emmanuel Biumla, contratado pelo Angers, que já havia acertado com o gabonês Jacques Ekomié, outra jovem promessa que teve uma ascensão meteórica na temporada anterior, participando de 25 partidas.

Deste modo, com os contratos do elenco inteiro rescindidos, bem como aqueles referentes aos membros da comissão técnica liderada pelo treinador Albert Riera, além dos fechamentos do centro de treinamentos e da academia das categorias de base, o Bordeaux, literalmente, teve o último prego do seu caixão martelado 15 anos depois do hexa francês.

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